sexta-feira, 18 de abril de 2008

POEMAS SOBRE FRUTAS

Uma micro-antologia
Adoro frutas. Todas. Não me canso de pesquisar, descobrir e consumir o tema. Será isso um tipo de “Complexo de Éden”? Bem, os que crêem no Senhor Jesus sabem que um dia o Jardim do Éden nos será ‘reaberto’. Enquanto isso, contentemo-nos com o que temos – mas como assim? Temos muito! Milhares de espécies de vegetais nos dão frutos, a grande maioria de uma forma ou outra comestível ou aproveitável.
E outra coisa por demais amorável é a Poesia. Daí esta breve seleta, um pequeno, mas deleitoso festival de cores, sabores e versos. Uma seleção feita meio que de chofre, consultando alguns livros aqui na estante, mas principalmente a internet. Nada ‘acadêmico’, com certeza. Estão reunidos aqui, e misturados (como numa verdadeira salada de frutas) autores antigos e modernos, famosos ou nem tanto; brasileiros, portugueses e da África lusófona.
Sinta-se à vontade para reproduzir esta seleta em teu blog ou site. Mas não deixe e citar a fonte. E bom apetite!
Ah, e para antologias de maior fôlego, ditas pretensiosamente "sérias", confira AQUI o que tenho feito, sempre gratuitamente.

NOTA: Este post reunindo poemas sobre frutas é de dez anos atrás (2008). Agora, em 2018, publiquei uma antologia inteira de poemas sobre árvores (tanto "a árvore" em geral, quanto árvores por espécie, inclusive muitas delas fruteiras, como mangueira, cajazeiro, cajueiro etc.). Por isso, insiro aqui, neste post antigo, a informação e o link para download da referida antologia. Confira abaixo. E, mais abaixo, seguem os poemas sobre frutas :)

ÁRVORE - Uma Antologia Poética - O termo grego ανθολογία (antologia), significa “coleção ou ramalhete de flores”. Daí o latim florilegium. O termo florilégio encaixa-se bem ao presente trabalho, onde procurou-se coligir poemas sobre a árvore, esse centro e pilar da hera. Adicionamos ao volume uma pequena seleção de frases sobre o tema, e, em arremate, publicamos o texto integral (vertida sua grafia ao português hodierno) do poema A Destruição das Florestas, do múltiplo Manuel de Araújo Porto-Alegre (1806 – 1879). O poema, que veio à luz em 1845, é um significativo e precoce exemplo de consciência ambiental em nossa literatura.
Além do elogio da árvore, presta-se aqui uma homenagem a nossos poetas de agora e de ontem, e de certa forma um serviço à literatura lusófona, pois toda antologia literária é antes de tudo isso - um serviço prestado a uma literatura e ao universo de seus usuários.
Este é um livro gratuito. Como amante das árvores e da literatura, como professor e como antologista, é um prazer ofertar este livro a todos, com votos de que ele possa ser compartilhado livremente, para que alcance os fins a que se propõe.

Para baixar o livro (224 págs., em formato PDF) pelo Google Drive, CLIQUE AQUI.

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Chuva de Caju
Joaquim Cardozo

Como te chamas, pequena chuva inconstante e breve?
Como te chamas, dize, chuva simples e leve?
Tereza? Maria?
Entra, invade a casa, molha o chão,
Molha a mesa e os livros.
Sei de onde vens, sei por onde andaste.
Vens dos subúrbios distantes, dos sítios aromáticos
Onde as mangueiras florescem, onde há cajus e mangabas,
Onde os coqueiros se aprumam nos baldes dos viveiros.
E em noites de lua cheia passam rondando os maruins:
Lama viva, espírito do ar noturno do mangue.
Invade a casa, molha o chão,
Muito me agrada a tua companhia,
Porque eu te quero muito bem, doce chuva,
Quer te chames Tereza ou Maria.

MANGA, MANGUINHA...
Tomás Jorge

A manga é um símbolo d´África:
No seu sabor,
No seu aroma,
Na sua cor,
Na sua forma.

A manga tem o feitio de um coração!
A África também.
Tem um sabor forte, quente e doce!

A África também.
Tem um tom rubro-moreno
Como os poentes e as queimadas
Da minha Terra apaixonada.

Por isso te gosto e te saboreio,
Ó manga!

-- Coração vegetal, doce e ameno.

Tu és o amor do abacate
Porque ele guarda no seu meio
Um coração que por ti bate;
Bate, bate, que bate!
Ó
manga, manguinha.


A minha goiabeira
P. Bandeira

No jardim da minha casa
mora uma grande amiga.
É uma velha goiabeira,
Linda, grande e muito antiga.
“Isso é manacá-da-serra!”
minha mãe disse para mim,
e eu bem sei que goiabeira
não se planta no jardim.
Mas eu gosto de goiaba,
manacá nunca comi
Pois pra mim é goiabeira,
minha amiga e companheira,
e eu não quero discutir.
“Manacá é uma flor,
não é uma fruta de comer.”
Me explicaram outro dia,
e eu não quis nem responder,
pois eu pego uma goiaba
que a mamãe comprou na feira,
vou correndo pro jardim
procurar a goiabeira,
pra deitar na sua sombra
e fingir que foi dali,
de um galho dos mais altos,
que a goiaba eu colhi.
Quando a tarde é de calor,
subo lá na goiabeira,
e, pensando pensamentos,
passo o tempo e a tarde
inteira.
Ela é uma grande amiga,
me dá sombra e cheira bem.
acho até que ela sorri
E conhece a mim também.
Veio um homem outro dia
minha amiga examinar.
Disse que ela tinha bicho
e não ia mais sarar.
“Essa árvore é bem velha,
não tem cura na verdade.
Eu vou ter de derrubar,
pois tem bicho em
quantidade.”
A tristeza não tem hora,
a tristeza não se atrasa:
vão cortar a goiabeira
do jardim da minha casa.
Que será que ela tem
que com a vida dela acaba?
Ou pegou bicho-de-pé
ou tem bicho de goiaba...

Pomar
Henriqueta Lisboa

Menino-madruga
o pomar não foge!
( Pitangas maduras
dão água na boca.)
Menino descalço
não olha onde pisa
Trepa nas árvores
Agarrando pêssegos.
( Pêssegos macios
como paina e flor
dentadas de gosto!)
Menino, cuidado,
jabuticabeiras
novinhas em folha
não agüentam peso.
Rebrilham cem olhos
Agrupados, negros.
E as frutas estalam
- espuma de vidro
nos lábios de rosa.
Menino guloso!
Menino guloso,
ontem vi um figo
mesmo que um veludo,
redondo, polpudo,
e disse: este é meu!
Meu figo onde está?
— Passarinho comeu,
passarinho comeu ...

JACA ((JÁ) CÁ)
Asdrúbal de Campos (sim, um dos irmãos Campos)
Já cai a jaca,
cai já cá...
Jacaré! Jacaré!
Jaca... a ré?
Ué!
Jacarandá ou não dá?
Ah, sei lá!
Juca viu a jaca.
- Já?!?!

CARAMBOLA
Elias José

Que cara esquisita
tem a carambola!
Que jeito estranho
tem a carambola!

Parece que diz:
— Não me amola!

Parece frutra de plástico
ou feita de cera.
Toco e cheiro a carambola
e ela nem me dá bola.

Pra comer, até bem madura
eu não gosto, não topo!
Mas transformada em suco,
bem geladinho e doce,
encho todo o copo
e refresco o corpo.


Caramba, como é bom
o suco da carambola!

Frutos
Eugénio de Andrade
Pêssegos, pêras, laranjas,
morangos, cerejas, figos,
maçãs, melão, melancia,
ó música de meus sentidos,
pura delícia da língua;
deixai-me agora falar
do fruto que me fascina,
pelo sabor, pela cor,
pelo aroma das sílabas:
tangerina, tangerina.



MEUS OITO ANOS (trecho)

Casimiro de Abreu

Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!
... ... ... ... ... ...




Leito de folhas verdes (trecho)

Gonçalves Dias
Por que tardas, Jatir, que tanto a custo
À voz do meu amor moves teus passos?
Da noite a viração, movendo as folhas,
Já nos cimos do bosque rumoreja.
Eu sob a copa da mangueira altiva
Nosso leito gentil cobri zelosa
Com mimoso tapiz de folhas brandas,
Onde o frouxo luar brinca entre flores.
Do tamarindo a flor abriu-se, há pouco,
Já solta o bogari mais doce aroma!
Como prece de amor, como estas preces,
No silêncio da noite o bosque exala.
... ... ...



A ROMÃ

Emílio de Meneses
Mal se confrange na haste a corola sangrenta
E o punício vigor das pétalas descora.
Já no ovário fecundo e entumescido, aumenta
O escrínio em que retém os seus tesouros. Flora!
E ei-la exsurge a Romã. Fruta excelsa e opulenta
Que de acesos rubis os lóculos colora
E à casca orbicular, áurea e eritrina ostenta
O ouro do entardecer e o paunásio da aurora!
Fruta heráldica e real, em si, traz à coroa
Que o cálice da flor lhe pôs com o mesmo afago
Com que a Mãe Natureza os seres galardoa!
Porém a forma hostil, de arremesso e de estrago,
Lembra um dardo mortal que o espaço cruza e atroa
Nos prélios ancestrais de Roma e de Cartago!


A manga
Ana Paula Ribeiro Tavarez (Angola)
Fruta do paraíso
companheira dos deuses
as mãos
tiram-lhe a pele
dúctil
como, se de mantos
se tratasse
surge a carne chegadinha
fio a fio
ao coração
leve
morno
mastigável
o cheiro permanece
para que a encontrem
os meninos
pelo faro




Frutos

Antonio Cardozo (Angola)

Que frutos feios os da Europa:
Não têm nome, nem têm cor,
Não tem cheiro, nem sabor.
 
    Maracujá      maboque         
        Abacate      sapessape
 
Soam redondos na boca,
Cheiram nos olhos e na memória
 
               Sôfrega,
                       Sôfrega...



Mangas verdes com sal

RUI KNOPFLI (Moçambique)

Mangas verdes com sal
sabor longínquo, sabor acre
da infância a canivete repartida
no largo semicírculo da amizade.

Sabor lento, alegria reconstituída
no instante desprevenido,
na maré-baixa,
no minuto da suprema humilhação.

Sabor insinuante que retorna devagar
ao palato amargo,
à boca ardida,
à crista do tempo,
ao meio da vida."


O CAJU

Cesar Garcia Lima 

Eis o caju:

Protuberância

Vermelha ou amarela,

Que explode de um

Ponto de interrogação.

 

De sua substância tenra,

Feita carne,

Surge o sumo fluído,

Ferro líquido e travoso.

 

Mais que descrevê-lo

Ou presenciar sua existência,

É preferível devorá-lo

Com o trópico nas veias.

 

À Ilha de Maré (trecho)

Manuel Botelho de Oliveira
... ... ... ... ... ...
As fruitas se produzem copiosas,
e são tão deleitosas,
que como junto ao mar o sítio é posto,
lhes dá salgado o mar o sal do gosto.
As canas fertilmente se produzem,
e a tão breve discurso se reduzem,
que, porque crescem muito,
em doze meses lhe sazona o fruito,
e não quer, quando o fruto se deseja,
que sendo velha a cana, fértil seja.
As laranjas da terra
poucas azedas são, antes se encerra
tal doce nestes pomos,
que o tem clarificado nos seus gomos;
mas as de Portugal entre alamedas
são primas dos limões, todas azedas.
Nas que chamam da China
grande sabor se afina,
mais que as da Europa doces, e melhores,
e têm sempre a ventagem de maiores,
e nesta maioria,
como maiores são, têm mais valia.
Os limões não se prezam,
antes por serem muitos se desprezam.
Ah se Holanda os gozara!
Por nenhuma província se trocara.
As cidras amarelas
caindo estão de belas,
e como são inchadas, presumidas,
é bem que estejam pelo chão caídas.
As uvas moscatéis são tão gostosas,
tão raras, tão mimosas;
que se Lisboa as vira, imaginara
que alguém dos seus pomares as furtara;
delas a produção por copiosa
parece milagrosa,
porque dando em um ano duas vezes,
geram dous partos, sempre, em doze meses.
Os melões celebrados
aqui tão docemente são gerados,
que cada qual tanto sabor alenta,
que são feitos de açúcar, e pimenta,
e como sabem bem com mil agrados,
bem se pode dizer que são letrados;
não falo em Valariça, nem Chamusca:
porque todos ofusca
o gosto destes, que esta terra abona
como próprias delícias de Pomona.
As melancias com igual bondade
são de tal qualidade,
que quando docemente nos recreia,
é cada melancia uma colmeia,
e às que tem Portugal lhe dão de rosto
por insulsas abóboras no gosto.
Aqui não faltam figos,
e os solicitam pássaros amigos,
apetitosos de sua doce usura,
porque cria apetites a doçura;
e quando acaso os matam
porque os figos maltratam,
parecem mariposas, que embebidas
na chama alegre, vão perdendo as vidas.
As romãs rubicundas quando abertas
à vista agrados são, à língua ofertas,
são tesouro das fruitas entre afagos,
pois são rubis suaves os seus bagos.
As fruitas quase todas nomeadas
são ao Brasil de Europa trasladadas,
por que tenha o Brasil por mais façanhas
além das próprias fruitas, as estranhas.
E tratando das próprias, os coqueiros,
galhardos e frondosos
criam cocos gostosos;
e andou tão liberal a natureza
que lhes deu por grandeza,
não só para bebida, mas sustento,
o néctar doce, o cândido alimento.
De várias cores são os cajus belos,
uns são vermelhos, outros amarelos,
e como vários são nas várias cores,
também se mostram vários nos sabores;
e criam a castanha,
que é melhor que a de França, Itália, Espanha.
As pitangas fecundas
são na cor rubicundas
e no gosto picante comparadas
são de América ginjas disfarçadas.
As pitombas douradas, se as desejas,
são no gosto melhor do que as cerejas,
e para terem o primor inteiro,
a ventagem lhes levam pelo cheiro.
Os araçazes grandes, ou pequenos,
que na terra se criam mais ou menos
como as pêras de Europa engrandecidas,
com elas variamente parecidas,
de várias castas marmeladas belas.
As bananas no Mundo conhecidas
por fruto e mantimento apetecidas,
que o céu para regalo e passatempo
liberal as concede em todo o tempo,
competem com maçãs, ou baonesas
com peros verdeais ou camoesas.
Também servem de pão aos moradores,
se da farinha faltam os favores;
é conduto também que dá sustento,
como se fosse próprio mantimento;
de sorte que por graça, ou por tributo,
é fruto, é como pão, serve em conduto.
A pimenta elegante
é tanta, tão diversa, e tão picante,
para todo o tempero acomodada,
que é muito aventajada
por fresca e por sadia
à que na Asia se gera, Europa cria.
O mamão por freqüente
se cria vulgarmente,
e não o preza o Mundo,
porque é muito vulgar em ser fecundo.
O marcujá também gostoso e frio
entre as fruitas merece nome e brio;
tem nas pevides mais gostoso agrado,
do que açúcar rosado;
é belo, cordial, e como é mole,
qual suave manjar todo se engole.
Vereis os ananases,
que para rei das fruitas são capazes;
vestem-se de escarlata
com majestade grata,
que para ter do Império a gravidade
logram da croa verde a majestade;
mas quando têm a croa levantada
de picantes espinhos adornada,
nos mostram que entre Reis, entre Rainhas
não há croa no Mundo sem espinhas.
Este pomo celebra toda a gente,
é muito mais que o pêssego excelente,
pois lhe leva aventagem gracioso
por maior, por mais doce, e mais cheiroso.
Além das fruitas, que esta terra cria,
também não faltam outras na Bahia;
a mangava mimosa
salpicada de tintas por fermosa,
tem o cheiro famoso,
como se fora almíscar oloroso;
produze-se no mato
sem querer da cultura o duro trato,
que como em si toda a bondade apura,
não quer dever aos homens a cultura.
Oh que galharda fruita, e soberana
sem ter indústria humana,
e se Jove as tirara dos pomares,
por ambrósia as pusera entre os manjares!
Com a mangava bela a semelhança
do macujé se alcança;
que também se produz no mato inculto
por soberano indulto:
e sem fazer ao mel injusto agravo,
na boca se desfaz qual doce favo.
... ... ...


Jogos Frutais

João Cabral de melo Neto

De fruta é tua textura
e assim concreta;
textura densa que a luz
não atravessa.
Sem transparência:
não de água clara, porém
de mel, intensa.

Intensa é tua textura
porém não cega;
sim de coisa que tem luz
própria, interna.
E tens idêntica
carnação de mel de cana
e luz morena.

Luminosos cristais
possuis internos
iguais aos do ar que o verão
usa em setembro.
E há em tua pele
o sol das frutas que o verão
traz no Nordeste.

É de fruta dó Nordeste
tua epiderme:
mesma carnação dourada.
solar e alegre.
Frutas crescidas
no Recife relavado
de suas brisas.

Das frutas do Recife.
de sua família.
tens a madeira tirante.
muito mais rica.
E o mesmo duro
motor animal que pulsa
igual que um pulso.

De fruta pernambucana
tenso animal,
frutas quase animais
e carne carnal.
Também aquelas
de mais certa medida,
melhor receita.

o teu encanto está
em tua medida,
de fruta pernambucana,
sempre concisa.
E teu segredo
em que por mais justo tens
corpo mais tenso.

Tens de uma fruta aquele
tamanho justo; .
não de todas. de fruta
de Pernambuco.
Mangas,mangabas
do Recife. que sabe
mais desenhá-las.

És um fruto medido.
bem desenhado;
diverso em tudo da jaca,
do jenipapo.
Não és aquosa
nem fruta que se derrama
vaga e sem forma.

Estás desenhada a lápis
de ponta fina.
tal como a cana-de-açúcar
que é pura linha.
E emerge exata .
da múltipla confusão
da própria palha.

És tão elegante quanto
um pé de cana,
despindo a perna nua
de dentre a palha.
E tens a perna
do mesmo metal sadio
da cana esbelta.

o mesmo metal da cana
tersa e brunida
possuis, e também do oiti,
que é pura fibra.
Porém profunda
tanta fibra desfaz-se
mucosa e úmida.

Da pitomba possuis.
a qualidade
mucosa, quando secreta,
de tua carne.
Também do ingá,
de musgo fresco ao dente
e ao polegar.

Não és uma fruta fruta
só para o dente,
nem és uma fruta flor,
olor somente.
Fruta completa:
para todos os sentidos,
para cama e mesa.

És uma fruta múltipla,
mas simples, lógica;
nada tens de metafísica
ou metafórica.
Não és O Fruto
e nem para A Semente
te vejo muito.

Não te vejo em semente,
futura e grávida;
tampoucoem vitamina,
em castas drágeas.
Em ti apenas
vejo o que se saboreia,
não o que alimenta.

Fruta que se saboreia,
não que alimenta:
assim descrevo melhor
a tua urgência.
Urgência aquela
de fruta que nos convida
a fundir-nos nela.

Tens a aparência fácil,
convidativa,
de fruta de muito açúcar
.que dá formiga.
E tens o apelo
da sapota e do sapoti
que dão morcego.

De fruta é a atração
que tens, a mesma;
que tens de fruta, atração
reta e indefesa.
Sempre tão forte
na carne e espádua despida
da fruta jovem.

És fruta de carne jovem
e de alma alacre,
diversa do oiti-coró
porque picante.
E, tamarindo,
deixas em quem te conhece
dentes mais finos.

És fruta de carne ácida,
de carne e de alma;
diversa da do .mamão,
triste, estagnada.
É do nervoso
cajá que tens o sabor
e o nervo-exposto.

És fruta de carne acesa,
sempre em agraz,
como araçás, guabirabas,
maracujás.
Também mangaba..
deixas em quem te conhece
visgo, borracha.

Não és fruta que o tempo
ou copo de água
lava de nossa boca
como se nada.
Jamais pitanga,
que lava a Iínguae a sede
de todo estanca.

Ácida e verde, porém
já anuncias
o açúcar maduro que
terás um dia.
E vem teu charme
do leve sabor de podre
na jovem carne.

Aumentas a sede como
fruta madura
que começa a corromper-se
no seu açúcar.
Ácida e verde:
contudo, a quem te conhece
só dás mais sede.

Ao gosto limpo do caju,
de praia e sol,
juntas o da manga mórbida,
sombra e langor.
Sabes a ambas
em teus contrastes de fruta
pernambucana.

Sem dúvida, és mesmo fruta
pernambucana:
a graviola, a mangaba
e certas mangas.
De tanto açúcar
que ainda verdes parecem
já estar corruptas.

És assim fruta verde
e nem tão verde,
e é assim que te vejo
de há muito e sempre.
E bem se entende
que uns te digam podre e outros
te digam verde.



A Romã
Paul Valéry
(Tradução de Cláudio Nunes de Morais)

DURAS romãs entreabertas
Cedendo a excessivas sementes,
Eu vejo em tantas descobertas
Soberanas frontes ardentes!

Se os sóis a que vós resistis,
Ó granadas entrefechadas,
Vos fazem de orgulho lavradas
Rachar paredes de rubis,

E se, ouro seco, a casca acode
A um pedido de força e explode
Em gemas de sumo carmim,

Nessa luminosa ruptura
Sonha uma alma que havia em mim
Com sua secreta arquitetura.



O Fruto

Rainer Maria Rilke
(Tradução de Augusto de Campos)

Subia, algo subia, ali, do chão,
quieto, no caule calmo, algo subia,
até que se fez flama em floração
clara e calou sua harmonia.

Floresceu, sem cessar, todo um verão
na árvore obstinada, noite e dia,
e se soube futura doação
diante do espaço que o acolhia.

E quando, enfim, se arredondou, oval,
na plenitude de sua alegria,
dentro da mesma casca que o encobria
volveu ao centro original.


Pêssego, sonho meu
Nane Sylvestre


Teu sabor acalma
Refresca até a alma
O teu cheiro doce
Quer no suco ou na fruta
Evoca sensações imaginárias
Como se verdade fosse.

Frágil ao toque,
Macia é tua pele.
Mas nas entranhas
Da tua aparência nobre
Trazes fibras a quem
Pelo teu encanto se enleve.

Pêssego, fruta linda desses versos,
Por muitos não és contemplada
Pois não nasces em solos diversos.
Para ver tua linda florada,
Há que se ter um clima temperado,
Terra úmida e bem cultivada;
Como o solo de um coração enamorado.




As Cerejas

Rui Miguel Duarte


rasgando o frio a fogo
moldadas pelo sol
ou então lágrimas
dadas à incólume
árvore de sangue,
em paga dos seus trabalhos


ei-las no dia certo

cume da Primavera

e acume dos olhos

inevitáveis, mais

que a nossa vontade
contrárias a toda a razão



as cerejas

à boca reveladas



Açaí


Thiago Azevedo

Em tigela ou cuia,
Toma-se esse suco roxo,
Dele se usa tudo,
Até mesmo o seu caroço.
Bebe com farinha d’água
Feita da mandioca,
Ou misturado e gelado
Com farinha de tapioca.

Pode se chamar juçara,
Ou até mesmo açaizeiro,
Toma-se com açúcar doce,
Ou mesmo sem muito floreio.

Tanto faz, como tanto fez,
Nada diminui esse desejo,
De ser consumida,
Por esse povo belo e guerreiro
Que no mercado de ferro,
O grande Ver-o-Peso,
Expõe seu grande apreço.

Mesmo não se tomando o suco,
Pode também embelezar
Que nas mãos do artesão
Um belo cordão a ornamentar.

Dos teus caroços um belo mosaico
Enfeita o pescoço da bela cabloca
Desse estado, o meu Pará.
Arte aprendida com os índios,
Repassada aos filhos
Através desse belo idílio.

Nas lendas se chama iaçá
Uma planta que não pára de chorar
Em nosso coração,
Sua semente a brotar
Pequenas lágrimas roxas,
Açaí quero te chamar.


O Meu Pomar
Cecília Meireles
Se eu tivesse um pomar, um pequeno pomar que fosse,
não lhe poria grade à roda como os outros proprietários.
Não poria a guardá-lo, um desses cães enormes, rancorosos,
que andam sempre rondando os pomares...
O meu pomar seria assim: todo aberto, para todos.
E, quando o outono chegasse e as árvores ficassem cheias de frutos amarelos
e vermelhos, nenhum pobrezinho teria fome,
nenhuma criança choraria de sede, passando pelo meu pomar...
E, no inverno, ainda haveria lá onde alguém se abrigasse,
quando chovesse muito ou fizesse muito frio...
Se eu tivesse um pomar, ele estaria sempre em festa,
cheio de borboletas e pássaros...
Como eu seria feliz, se tivesse um pomar!


Belém do Pará (trechos)

Manuel Bandeira

Bembelelém 

Viva Belém!
... ... ... 
Cidade pomar 
(Obrigou a polícia a classificar um tipo novo de deliquente: 
O apedrejador de mangueiras.) 
... ... ...
Terra da castanha 
Terra da borracha 
Terra de biribá bacuri sapoti 
Terra de fala cheia de nome indígena 
Que a gente não sabe se é de fruta pé de pau ou ave de plumagem bonita. 

Nortista gostosa 

Eu quero bem. 
... ... ...
E foi pra me consolar mais tarde 
Que inventei esta cantiga: 

Bembelelém 

Viva Belém! 
Nortista gostosa 
Eu te quero bem.



Cantiga das Crianças Fruteiras



Sammis Reachers

Cantiga das Crianças Fruteiras
(Você pode baixar este poema na forma de um belo e ilustrado arquivo em pdf, que pode ser livremente impresso para fins educativos, clicando AQUI)

Pedrinho tem fome de mato,

das frutinhas que tantas dão por lá

a madurez ele conhece no tato,

no olhar, olfato e paladar:

 

Cajuí, taperebá, araticum e cajá

cambuci, guabiroba, cagaita e maracujá

 

Juca é menino peralta e erradio

se vê de longe um pomo a brilhar,

corre e pula até cerca de sítio,

e lá se vai, frutas a apanhar:

 

Pindaíva, marôlo, sorvinha e biribá

saguarají, feijoa, sapoti e joá

 

Gustinho não poupa ninguém

só atina se a fruta é veneno;

se tem polpa pouca

ou se nem polpa tem,

a de vez ele come,

a passada também:

 

Mangaba, bacupari, tucum e butiá

uarutama, guriri, marmelinho e ingá

 

Renato é um bicho-do-mato:

chafurda nas matas,

rompe pelos florestins

sabe o tempo de todas as frutas,

e deita sozinho a fazer seus festins:

 

Babaçu, inajá, mandacaru e bacuri

sapota, araçá, cupuaçu e cacauí

  

Fernandinho é moleque fruteiro:

O pomar da avó é seu melhor brinquedo.

É fruta que não acaba tão cedo

e lá vai ele, arteiro,

trepar no arvoredo:

 

Grumixama, camu-camu, marmixa e abiu

pururuca, pitangatuba, murtinha e cubíu

 

Marcinha é a princesinha das plantas

plantar e colher é sua missão infantil

corre serelepe pelas vizinhanças

buscando frutas nativas do nosso Brasil:

 

Macaúba, ariri, murmurú e açaí

babaçu, batolé, catolé e licuri

 

De toda fruta nova que come

e a cada caroço que enterra no chão,

Marcinha entoa sua bela oração:

"Cresça, e dê fruta para quem tem fome!”

 

Mari-mari, jaramantaia, marmixa e uxi

mandovi, guabiroba, puçá e guaburiti

 

Saltam riacho, cerca de roça,

mata fechada e o que se lhes dá;

comem de tudo e tudo sem pressa,

sorvendo o bom doce de tudo o que há:

 

Acumã, pequiá, jameri e jaracatiá

aboirana, curriola, fruta-de-tatu e cambuiú


Sammis Reachers



FRUTAS

Philippe Jaccottet
Trad. de Cláudio Veiga

Nos aposentos dos vergéis
são globos pendurados
pela marcha do tempo coloridos
lâmpadas que o tempo acende
e cuja luz é perfume

sob o ramos se respira
o chicote perfumado da pressa
São pérolas na relva
de nácar mais cor-de-rosa
quanto menos longe esteja a bruma

brincos mais pesados
quanto menos vestido enfeitem

Como estão dormindo há muito
No verdor de suas pálpebras!

E como o calor

Avivado pela pressa
a seus olhos dá mais fome!



Poema da manga espada

Milton Duarte

O Senhor que me desculpe,
Mas Eva foi enganada
A melhor fruta do Paraíso
Não era maçã, não era nada
Era doce e suculenta
Outra igual não se inventa
Eu falo da manga espada.

Essa eu chupo com as duas mãos
Meto a boca e me lambuso
Chupo uma bacia inteira
O seu doce eu não recuso
Chupo uma, duas, três,
Se tiver, chupo mais seis
Dessa fruta eu não abuso.

Deus estava inspirado
Quando criou a manga espada
Ela só tem um defeito
É orgulhosa a danada
Não dá o ano inteiro
Já pertinho de janeiro
Dá as caras, a safada.

Mas fica é mais gostosa
Vale à pena esperar
Não importa o tamanho
Se é daqui ou dacolá
Manga espada madurinha
Inchada e até verdinha
Para mim é um maná.


O POEMA PITANGA

Sammis Reachers

Pitangas sabor de sol
sabor de sol e mar pitangas
fruta odalisca solar
em meus bolsos palato coração
dois bolsos repletos
para o viés do dia
valdevinas pitangas...

madeirites de sandboard,
dunas de Itaipu, adeus meu patrão,
deslizar pitangas...

afrodisíacas, afrodisiarcontes pitangas
a dor areal que o mar apaga
a felicidade maral que a areia gesta
nesta cópula sensorial sublimi(lu)nar

rubicundelirantes pitangas...


CAQUI

Sammis Reachers

Pomo de outono

Dulçor em revolução

Fruto proibido do mandarim

Pelo mundo em lusas naus

Disseminado

 

Coisa de explodir contra o dentro das bocas

Ente todo-fruta, carcaça de mel

Beijo tenro, rublo rio

Cio, cicio, vício paradisíaco




8 comentários:

Anônimo disse...

Oi Anjinho !!!
Tudo bem ? Adoro seus textos e hoje resolvi publicar um texto seu no meu cantinho .Espero que vc não ache ruim .
Beijinhos
Jan

http://jan-frutas.blogspot.com

Silvia Rossine disse...

Olá ! Adorei suas postagens sobre alimentação e copiei seu link para as pessoas interessadas neste tema acessarem ok!

E obrigada pelo capricho e pela maravilhosa postagem .

Com carinho
Silvia Rossine

Seu link está em Sily..L@ndia ok! www.silylandia.blogspot.com

Simara disse...

Gosteim muito do seu blog. Os poemas sobre frutas me ajudarão num projeto de escola na educação infantil. se quiser, visite o meu blog http://cantinhoxcriativo.blogspot.com/ escrevi um livro infantojuvenil que estou divulgando lá, além disso há posts sobre literatura e outros... Beijos

Unknown disse...

Sammis,

"As vontades fracas traduzem-se em discursos; as vontades fortes, em ações." Gustave le Bon

Visitei o seu blog e fiquei encantada e pretendo ler seus livros.

Encontrei seu blog procurando imagem de "manga" para ilustrar atividades que estou desenvolvendo. Citei a referência do seu blog. Espero que muitas crianças e educadores visitem tb esse espaço. Com certeza, ele está leve e cheio da preesença do Criador.
Minhas palavras para você: parabéns e gratidão!

Um forte abraço recheado de AMOR&LUZ! Conceição

Sammis Reachers disse...

Olá minhas caras, obrigado por suas visitas e seu carinho.
Me perdoem por só agora responder - é que mantenho muitos blogs e acabo me 'enrolando' nesse trabalho todo.
Tenho mais alguns poemas sobre frutas, que gostaria de inserir aqui, para ampliar a mini-antologia, mas falta tempo. Mas assim que der publico!

Um abraço minhas amigas, Deus lhes abençoe!

PROFESSORA CLAUDETE MARIANO disse...

"Belos esses poemas...dá vontade de ler sem parar...Continue seu belo trabalho delicado e cativante."
Claudete Nóbrega

Unknown disse...

Amei

Unknown disse...

Amei

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